É difícil utilizar qualquer outra palavra para resumir a relação entre a indústria e o varejo que não seja controversa. Por um lado, o setor industrial parece se atentar somente à fabricação de seus produtos dentro do seu conceito de economia de escala, ignorando as necessidades do varejo. Por outro, o segmento varejista foca a sua atenção somente na venda e rentabilidade dos itens, sem necessariamente dar ouvidos aos interesses e dificuldades por parte dos fabricantes. Assim, por mais evidente que um vínculo mais forte entre as partes seja imprescindível, ainda é comum observarmos cada lado tratando um ao outro como adversários, e não como um verdadeiro parceiro estratégico de negócios.
Um exemplo que pode parecer simplista, mas que resulta em custos e desperdícios enormes para ambos os segmentos são as embalagens dos produtos. Hoje, a maioria das indústrias entregam a sua mercadoria ao varejo da forma que considera mais conveniente. Como consequência, o varejo precisa adequar as gôndolas e sua estrutura operacional para ofertar os itens aos clientes nas quantidades adequadas ao giro do produto.
Ou seja, ou ele manda para a loja na embalagem de fábrica e carrega um custo elevado de estoque em loja, ou efetua o desmembramento da caixa master no depósito e manda só o giro para a loja, gerando um custo operacional elevado e com alto risco de danificar o produto no transporte.
Portanto, fica evidente que se faz necessário um melhor alinhamento de soluções entre as partes. No caso das embalagens, todos sairiam beneficiados se existisse uma maneira das indústrias fabricarem os produtos alinhados à praticidade necessária para o varejo.
Essa situação, por mais simples que seja, é uma boa amostra de como uma melhor conexão pode ampliar consideravelmente a produtividade dos dois segmentos. Porém, os ganhos tendem a ser maiores se avaliarmos projetos e debates que se enquadrem em aspectos ainda mais estratégicos como, por exemplo, as práticas comerciais.
Hoje, é rotineiro que o varejo “empurre” os pedidos para o mais próximo possível do fim do mês sabendo que a indústria, muitas vezes, melhora as condições comerciais por conta de suas cotas e metas internas. No entanto, tal prática tende a causar problemas ao planejamento do setor industrial e, ao mesmo tempo, gerar também dificuldades para o próprio varejo a longo prazo, uma vez que o setor pode ter sua demanda não atendida quando for necessária.
Portanto, essa é mais uma queda de braço que poderia ser facilmente solucionada se existisse um alinhamento entre os setores. Com a construção de um planejamento estratégico sob demanda, a indústria conseguiria ajustar a sua produção a longo prazo, além de atender ao varejo de uma forma muito mais assertiva no que diz respeito ao tamanho das embalagens dos itens, proporcionando, possivelmente, até uma embalagem que já fosse direto para a gôndola, aumentando a eficiência da reposição sem deixar a loja esteticamente “feia”.
Caminho traçado
A grande verdade é que indústria e varejo estão conectados de uma forma que é impossível de ser apartada. Sem produtos não há comércio, e sem comércio o produto não chega ao cliente. Como se trata de uma relação inevitável, está mais do que na hora de torná-la realmente propícia e eficiente. A colaboração mútua e a integração dos interesses e demandas, numa discussão cada vez mais aberta e saudável, tende não só a ser extremamente benéfica e produtiva para os dois setores, mas principalmente para o alvo comum de ambos: nós, consumidores.
No entanto, acredito que já está na hora de acelerarmos o ritmo dessa caminhada. Por isso, avalio que as associações devem assumir um papel de protagonismo no processo. Até porque, um representante do varejo falando individualmente não tem força suficiente para mudar todas as nuances da cadeia industrial, assim como o inverso também se aplica. Para que as transformações ocorram de forma efetiva, é imprescindível que as discussões sejam desenhadas a partir de discursos representativos de uma visão macro de ambos os ecossistemas, o que só será possível por meio da representatividade das entidades de classe.
Graças a atuação dessas diversas associações, que se destacam sobretudo a nível de representatividade dentro da esfera pública, os setores já mostraram sinais de que estão começando a traçar um caminho comum e único para fortalecer sua integração. Por que não dar mais esse novo passo?
fonte: Carlos Wayand, CEO da Mob2Con