Copiar a estratégia de outra empresa pode parecer um atalho inteligente, mas na maioria das vezes, é o caminho mais rápido para a frustração.
Nos bastidores de quase todo comitê executivo há sempre um PowerPoint “inspirado” no case do momento. Seja uma página tirada da Amazon, da Tesla ou do Nubank, é tentador tentar aplicar a “estratégia do outro” à sua própria realidade. Afinal, se funcionou lá, por que não aqui?
O problema é que estratégia não é receita de bolo. Ela não é um conjunto de táticas copiáveis. Ela é um sistema integrado, desenhado sob medida para um contexto específico, com cultura, timing, equipe e clientes únicos.
Se você muda uma peça sem entender o todo, o sistema desmorona.
1. A mágica está nas interconexões (não nas táticas isoladas)
Empresas vencedoras não fazem apenas “coisas certas” — elas combinam decisões que se reforçam mutuamente. O que parece uma boa ideia isolada pode se tornar um desastre se não estiver encaixada no sistema certo.
Caso real: A Southwest Airlines é celebrada por sua eficiência operacional e cultura forte. Muitas tentaram imitá-la, como a Spirit Airlines. Ambas operam com tarifas baixas, mas a Southwest foca em pontualidade, equipe engajada e voos diretos com uma única frota (Boeing 737). Já a Spirit aposta em tarifas ultra-baixas com múltiplas cobranças extras. Resultado: são modelos diferentes com resultados distintos, mesmo partindo de um mesmo setor.
2. Estratégia fora do contexto vira ruído
O que funciona para um não serve para outro, simplesmente porque o ambiente muda: consumidores diferentes, timing de mercado, concorrência e regulamentações.
Airbnb vs. VRBO: Ambas atuam com aluguel de curto prazo, mas a primeira promove experiências únicas, inclusive em quartos compartilhados. A segunda foca em casas inteiras, para famílias. Copiar o modelo da outra seria trair seus públicos-alvo. Mesma indústria, estratégias diferentes.
Segundo estudo da Harvard Business Review, 63% dos projetos de transformação estratégica falham por desalinhamento com o contexto de mercado.
3. Cultura não se terceiriza
A cultura é o terreno onde qualquer estratégia precisa florescer. Sem o solo certo, a semente da estratégia morre.
Vanguard vs. Charles Schwab: Ambas oferecem investimentos de baixo custo. Mas a Vanguard é uma cooperativa de investidores com foco em longo prazo e propósito de servir ao cliente. Já a Schwab aposta em inovação e acessibilidade com uma pegada mais empreendedora. Uma não conseguiria operar a lógica da outra com autenticidade.
4. Diferenciação é a alma da estratégia
Se a sua estratégia pode ser copiada facilmente, talvez ela nem seja uma estratégia de verdade. Ser diferente é um dos pilares que sustentam uma Licença Estratégica, como diz meu sócio Piero (coautor do Feitas pra mudar)
Apple vs. Microsoft: Uma aposta na experiência premium e integração entre hardware e software. A outra se consolidou em software corporativo e flexibilidade. Estratégias moldadas pelas forças de cada uma. Se a Microsoft tentasse virar uma Apple, perderia seu maior trunfo: a penetração nas empresas.
Um estudo da McKinsey com mais de 1.000 executivos mostrou que empresas com uma proposta única de valor e diferenciação clara têm 2,4x mais chance de crescer acima da média do setor.
Copiar é confortável. Criar é estratégico.
Inspirar-se é saudável. Mas aplicar um modelo sem entender as raízes que o sustentam é desperdiçar energia e, pior, desalinhar sua empresa com sua própria essência.
Cada empresa precisa construir sua estratégia como um terno sob medida, feito para seu corpo, seu momento e seu mercado. Um paletó do Steve Jobs não cabe no CEO da sua empresa, e nem deveria.
Feitas para mudar: sua estratégia nasce de você
Se há algo que esse projeto defende com convicção é que empresas que querem durar, precisam aprender a mudar. Mas mudar com coerência, com verdade, com clareza sobre quem são.
Copiar é preguiça disfarçada de benchmarking. Criar é a arte de se posicionar com coragem e lucidez.